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As reflexões do meu tio Abdo. Artigo de Adib Fadel

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عبدو عون

As reflexões do meu tio Abdo.

Acordei um tanto saudosista. A idade deve fazer isso com a gente, pois esse saudosismo me tem ocorrido com mais frequência a cada dia. Hoje, a recaída foi por conta das inúmeras reflexões do meu tio Abdo. Tio da minha mãe, na verdade. Ele veio do Líbano, pela primeira vez, antes da primeira guerra mundial e morreu por aqui com cerca de cem anos de idade.

Tive o privilégio de conviver e conversar com ele sobre os mais diversos assuntos – normalmente filosóficos e desafiadores. Era um pensador. Lia muito, apesar das dificuldades com a vista cansada pelos anos e até escreveu (em árabe) dois livros de poesias. Gostava de conversar, de contar histórias e de questionar sobre fatos variados. Na sua “ociosidade criativa” sempre aparecia com algumas preciosidades como as duas que escolhi para compartilhar.

A primeira é sobre parentes e amigos. Numa longa conversa na tarde de um sábado, ele me perguntou o que eu achava mais importante – um parente ou um amigo.

Ele era, por assim dizer, o patriarca da família e eu era testemunha do zelo dele e da minha tia com ela. Então não tive dúvida e afirmei que era um parente, porque, ponderei, o amigo poderia ser temporário e é sempre difícil saber quem é amigo de verdade.

Depois de me ouvir com a paciência de sempre, ele me perguntou se eu achava que todos os meus parentes eram meus amigos e se eu estava certo de que podia contar com eles. Surpreso com a pergunta, respondi que não.

Conversamos mais um pouco sobre o tema e sobre como melhorar esse quadro até o momento que ele arrematou: “Para ser bom, o parente precisa ser amigo, mas para ser bom, o amigo não precisa ser parente.”

A segunda é mais científica. Numa outra longa conversa, ele me propôs o esclarecimento de uma dúvida. Formulou, com muitos detalhes, o seguinte problema: Uma pessoa coloca uma caixa d’água de mil litros no fundo do quintal. Compra alguns sacos de terra adubada, pesa a terra, mede a sua umidade, enche a caixa e anota num caderno o peso de terra seca. Semeia sementes de cenoura, faz a colheita da cenoura, pesa o material colhido, mede a umidade e anota no mesmo caderno o peso da colheita seca. Repete esse plantio e essa colheita por três vezes. Finalmente, pesa a terra que ficou, mede a umidade e anota no mesmo caderno o peso seco da terra restante.

A pergunta: O peso da terra seca restante é igual ao peso da terra seca inicial menos o peso seco das cenouras (e folhas) colhidas?

Convicto da verdade da “Lei de Lavoisier – Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”, respondi que sim. Não conseguimos chegar a um acordo. Na verdade, ainda não tenho a resposta. Quem a tiver, por favor me ajude.

A propósito, lá em cima está escrito: Abdo Aoun.

Adib Fadel escreve para o Cidade Botucatu

 

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Brasil

Artigo: A PEC dos Estupradores e a naturalização da pedofilia no Brasil

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Dra. Celeste Leite dos Santos (MP-SP)*
Numa afronta à opinião pública, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, em Brasilia-DF, aprovou Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que proíbe o aborto no Brasil até em casos previstos na lei, como o estupro, por exemplo. Tal projeto – que recebeu a alcunha de PEC dos Estupradores, não sem motivo — elimina qualquer resquício de liberdade de escolha de meninas e de mulheres, em nosso País, de serem mães quando vítimas de abusadores / agressores.
Ainda que não se tenha consenso sobre este tema em nossa sociedade, nem fatos novos que justifiquem a volta da discussão de assunto infame, após ampla rejeição popular da iniciativa, fato é que, a questão em tela é mais séria e grave do que aparenta ser.
Ocorre que, hoje, o abortamento legal é permitido em casos de estupro, de risco de vida para a gestante, bem como quando é constatada a anencefalia do feto. Com a proposta em discussão – caso siga adiante e se torne norma constitucional, o Brasil corre o risco de se equiparar a nações como Honduras, El Salvador, República Dominicana e Nicarágua, que incluem a proibição do aborto desde a concepção em suas Constituições.
Os números deste tipo de crime em nosso País são estarrecedores. O Brasil registrou, somente em 2023, um estupro a cada seis minutos – totalizando 83.898 casos, entre estupro e estupro de vulnerável, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Salta aos olhos o fato de que, 76% destas ocorrências correspondam a estupros de vulneráveis, ou seja, quando há conjunção carnal ou outro ato libidinoso com menores de 14 anos, crianças, ou incapazes de consentir o sexo, seja por deficiência, falta de entendimento ou por enfermidade.
Se aprovada a iniciativa já chancelada pela CCJ, teremos, no Brasil, inegável banalização de outra modalidade de violência: a pedofilia. De conduta negativa e repugnante, o estuprador / agressor, de pedófilo, ainda passará a se denominar “pai”, e, assim, exercer papel socialmente aprovado em nosso meio – inclusive, balizado pelos direitos e por deveres decorrentes do poder da instituição familiar.
E, não menos importante: obrigar vítimas de um estupro, ou que se encontrem em situação de perigo de vida a serem mães acarreta a revitimização de meninas e de mulheres. Além do que, forçá-las a levar uma gravidez, uma gestação indesejada adiante traz impactos psicológicos graves e, muitas vezes, irreversíveis. Isso inclui traumas adicionais ao crime cometido, estigmatização e dificuldades de integração social.
Há de se considerar, ainda, que, a criminalização do aborto em casos de estupro pode potencializar a realização de procedimentos clandestinos, resultando, consequentemente, em complicações médicas graves e até em morte.
Em síntese: o Brasil não precisa punir vítimas, mas, sim, desenvolver políticas públicas efetivas de prevenção, de apoio e de desvitimização previstas no Estatuto da Vítima (projeto de lei 3.890/2020). O texto está parado no Congresso Nacional desde maio de 2023, por falta de vontade de políticos em abraçar, discutir e aprovar a questão.
Não é possível mais que se alegue desconhecimento e ignorância face aos efeitos nefastos da PEC dos Estupradores – sinônimo de retrocesso, um absurdo jurídico e inconstitucional, uma vez que é divorciado do que prevê nossa Carta Magna.
Aliás, o Brasil é signatário de diversos tratados internacionais de proteção aos direitos reprodutivos das mulheres. Logo, qualquer tentativa de criminalizar as hipóteses de aborto legal será um verdadeiro declínio em matéria dos direitos humanos fundamentais e da dignidade de mulheres e de meninas do nosso País.
*Dra. Celeste Leite dos Santos é presidente do Instituto Brasileiro de Atenção Integral à Vítima (Pró-Vítima); promotora de Justiça em Último Grau do Colégio Recursal do Ministério Público (MP) de São Paulo; doutora em Direito Civil; mestre em Direito Penal; especialista em Interesses Difusos e Coletivos; e idealizadora do Estatuto da Vítima, da Lei de Importunação Sexual, e do Projeto Estadual 130/2016 de Igualdade Plena de Homens e Mulheres.

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Brasil

Duas visões sobre a jurisdição do STF, artigo de Ives Gandras Martins

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No XII Congresso de Direito Constitucional da FADISA (Faculdade de Direito de Santo André) realizado em 18 de outubro deste ano, palestramos, os desembargadores Valdir Florindo do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo (2ª), Reis Friede do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, onde foi presidente, o Ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF, e eu.

A temática do evento foi “Ética e Liberdade, Liberdade com Ética”. O Ministro Luís Roberto Barroso e eu fomos os últimos a falar.

Embora o Ministro tenha abordado aspectos das oportunidades e riscos da evolução da inteligência artificial na Justiça e no mundo e eu, de meu lado, os fundamentos permanentes da ética, moral e liberdade, mais voltados ao direito natural, com sua evolução na História a partir da Filosofia, ambos apresentamos nossa interpretação da temática que, embora convergente em sua percepção é divergente em sua aplicação na realidade brasileira.

O eminente presidente da Suprema Corte entende que, apesar da aplicação do Direito por todo magistrado exigir permanente reflexão, como nem todas as situações judicializadas tem legislação pertinente regulatória, o juiz deve lastrear-se em princípios fundamentais albergados na Lei Suprema para dar solução adequada, o que, a seu ver, não é invadir as funções do Poder Legislativo, mas implementar, para a hipótese, o que está na Constituição. Assim, se o STF entender que, mesmo havendo legislação, aquela produção normativa do Congresso a respeito do princípio constitucional não é a mais adequada, pode atuar para oferecer a melhor exegese, por ser a instância máxima da interpretação jurídica.

Expus posição diversa. Por entender que, na Lei Suprema, há expressa disposição para que o Congresso zele por sua competência normativa (artigo 49, inciso XI) e que nem mesmo em ações diretas de inconstitucionalidade por omissão do Parlamento julgadas procedentes, pode o Pretório Excelso legislar (artigo 103, §2º), em nenhuma hipótese caberia ao STF dar uma solução legislativa à luz de princípios gerais.

É que os princípios gerais quando mais genéricos, permitem múltiplas interpretações, até mesmo conflitantes, como por exemplo o da “dignidade humana”, no qual tanto os defensores do aborto como os do direito do nascituro de ter a vida preservada desde a concepção, lastreiam-se, gerando, assim, a defesa de teses absolutamente opostas.

A Constituição portuguesa, para tais princípios de múltiplas acepções, expressamente admite que apenas prevalece a interpretação em lei dos representantes do povo, entendendo eu que tal princípio é implícito na Constituição brasileira, muitas vezes o silêncio parlamentar representando a vontade popular de que aquela matéria não seja naquele momento legislada.

À evidência, em palestra de quase uma hora de cada um de nós dois, diversos argumentos foram utilizados em hospedagem de nossas posições, sempre pelo prisma da ética e da liberdade.

Ao final, os dois fomos aplaudidos em pé pela plateia, elogiando os organizadores como podíamos na divergência manter elevado nível, segundo eles, de elegância e respeito, ao que disseram ser um verdadeiro confronto democrático de ideias.

Tenho pelo Ministro Luís Roberto Barroso particular admiração, desde que trabalhamos juntos na “Comissão de Notáveis” criada pelo presidente do Senado, José Sarney, para repensar o pacto federativo. Ofereci-lhe, ao final, meu livro “Uma Breve Teoria do Poder”, colocando a seguinte dedicatória: “Ao querido amigo e mestre Ministro Luís Roberto Barroso com afeto e admiração ofereço”. Ele, por sua vez, dedicou-me seu livro “Inteligência Artificial, Plataformas digitais e democracia”, com as seguintes palavras: “Para o estimado Professor Ives Gandra com a admiração de sempre e o renovador apreço“.

Ives Gandra da Silva Martins é professor emérito das universidades Mackenzie, Unip, Unifieo, UniFMU, do Ciee/O Estado de São Paulo, das Escolas de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme), Superior de Guerra (ESG) e da Magistratura do Tribunal Regional Federal – 1ª Região, professor honorário das Universidades Austral (Argentina), San Martin de Porres (Peru) e Vasili Goldis (Romênia), doutor honoris causa das Universidades de Craiova (Romênia) e das PUCs PR e RS, catedrático da Universidade do Minho (Portugal), presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio -SP, ex-presidente da Academia Paulista de Letras (APL) e do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp).

 

Os artigos não refletem, necessariamente, a opinião do Jornal Cidade Botucatu

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Botucatu

DIFÍCIL ENTENDER, artigo de Bahige Fadel

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Recentemente, ouvi uma notícia segundo a qual uma universidade federal do Maranhão havia contratado uma artista trans para apresentar a sua arte aos alunos. Sua apresentação foi uma dança erótica em que a referida artista trans mostrava suas partes íntimas, que, aliás, não deviam ser tão íntimas assim. E a artista deve ter feito um sucesso enorme, pois foi alegremente aplaudida. Quero deixar claro que ela foi paga por nós, que pagamos os nossos impostos.

A crônica não tem como objetivo discutir sobre sexo ou gênero, como preferem atualmente. Desejo falar sobre educação, sobre o processo de ensino e aprendizagem. Então, a pergunta que não quer calar é esta: O que a universidade ensinou e o que o aluno aprendeu, com essa apresentação artística? Notem que não estou colocando nada entre aspas, para que não pareça uma ironia do autor. Não quero ser irônico. Quero, apenas, dirimir dúvidas a respeito do processo de ensino e aprendizagem. já que meus longos anos na educação não foram suficientes para entender o que aconteceu, com o uso do meu dinheiro, nessa atividade.

Está certo. Podem dizer que o assunto era sexualidade ou gênero sexual. Até aí eu entendi. Agora, eu não consegui entender o que os alunos entenderam com o espetáculo apresentado pelo artista trans. Vamos lá: artisticamente, ele mostrou à plateia suas partes não tão íntimas. E o que isso ensina? O que isso mostra que os alunos ainda não conheciam? Um aluno universitário, em tese, já conhece esse tipo de espetáculo melhor que o professor. Na verdade, não ensinou nada. Apenas mostrou o que já havia sido visto. E não estou discutindo a qualidade da apresentação, pois não vi.

Isso me faz lembrar a época em que eu era diretor de escola. Numa festa cultural realidade pela escola que eu dirigia, uma turma apresentou uma dança moderna. As meninas dançaram direitinho. Quando fui cumprimentar a professora pela apresentação, perguntei-lhe como tinha sido o treinamento das alunas. Para minha surpresa, a professora me disse que não havia feito absolutamente nada. As meninas lhe disseram que desejavam dançar e a professora as inscreveu. Elas conheciam a dança, que era feita num programa de TV. Decepcionei-me. Era uma festa cultural. O mínimo que se podia desejar era um aprendizado artístico. Mas não houve nada. As meninas fizeram o que já sabiam fazer, independentemente da escola. Ou seja, a escola não teve participação alguma, a não ser ceder o espaço. Isso tem pouquíssimo valor para o processo de ensino e aprendizagem, pois ninguém aprendeu nada, nem a professora, que poderia ter feito uma pesquisa sobre aquele tipo de dança e explicado para seus alunos.

Voltemos ao espetáculo trans. Não tem alguma semelhança com a história que acabei de contar? Infelizmente, a tal universidade apoiou o professor responsável. Falou em diversidade cultural, em respeito às diferenças. Essas coisas aí que são ditas quando não há um argumento melhor. Na verdade, não passou de uma apresentação inútil ou quase inútil. Se houve alguma utilidade, foi a estupefação e a indignação que ocorreram.

Depois não entendem por que somos sempre os últimos nas avaliações internacionais de nossos alunos.

BAHIGE FADEL

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