Bahige Fadel
Um dia, jogando conversa fora com uns amigos, para passar o tempo, perguntei: Vocês notaram que nos filmes de ação, em que há muita violência, com bandidos e mocinhos se digladiando, os bandidos atiram muito mais que os mocinhos, mas acertam muito menos os tiros? Se você não notou, caro leitor, pode ‘ponhar reparo’, como me dizia um amigo dos velhos tempos. Os banidos, sempre em maior número que os mocinhos, não param de atirar, mas não acertam quase nada. E quando acertam, não é num lugar fatal; é no ombro ou nas pernas ou de raspão na cabeça. Mesmo quando acertam num lugar crítico, os mocinhos ainda conseguem se safar milagrosamente.
Pena que na vida real não seja bem assim. Na vida real, os bandidos são violentos, hábeis, certeiros e cruéis. Dificilmente dão uma chance ao cidadão comum, ao trabalhador, ao turista que só veio para o país para usufruir de suas maravilhas. Mesmo com a polícia, os bandidos são mais certeiros e matam muito mais. Mesmo havendo mais bandidos do que policiais. E os crimes dos bandidos deixam marcas e consequências. Deixam viúvas, deixam órfãos, deixam pessoas desamparadas e cidadãos inseguros.
E o pior de tudo é quando esses crimes não partem de criminosos-padrão. Desses criminosos, afinal de contas, a gente já espera que cometam crimes. Então, o que a gente faz é se prevenir. Se não quiser problemas com criminosos-padrão, evite certos lugares, ande apenas em espaços seguros, não dê moleza quando estiver no seu carro parado num sinal, não vá para lugares de risco. Ainda assim, você não estará totalmente seguro. Aí é rezar para Deus ou para todos os orixás que você conhece. Você, por exemplo, vai a uma agência bancária e, quando está lá dentro, a agência é assaltada. Nesse caso, há pouca coisa para fazer. O melhor que há é você passar despercebido. Deite de bruços, torça para não o pegarem como refém e deixe correr. O que mais há para se fazer?
O pior de tudo é quando os crimes ocorrem com criminosos que não são o padrão dos criminosos. O pior de tudo é quando você é atacado, com arma de fogo ou sem arma de fogo, por quem você menos espera. O pior é quando você se torna uma vítima de alguém em quem você confiava piamente, em quem você acreditada, em quem você depositava todas as esperanças. Nesse caso, é também terrível. Muitas vezes você não morre nem perde sangue, porque não dispararam nenhuma arma de fogo contra você. Mas morrem as suas esperanças, morre a confiança que você tinha no ser humano. E você se sente frágil. Parece que você contraiu uma doença incurável e que, por isso, não há muito que fazer. Você pensa em recorrer a outra pessoa para ajudá-lo, mas percebe que ela também foi atingida pelo mesmo criminoso ou por outros criminosos que tinham os mesmos objetivos do que aquele que o atingiu.
Vem, então, o desespero. Olha para as mãos, e elas estão atadas. Olha para os pés, e eles estão presos num lamaçal que se agiganta e se avoluma. Tenta gritar, mas sua voz está embargada. Quando consegue dizer uma palavra de socorro, percebe que os gritos dos outros ofuscam o seu grito minguado. Verte lágrimas de dor e de desesperança, mas ninguém sente pena delas. De um lado, há pessoas que sentem a mesma dor e a mesma desesperança. Do outro lado, estão pessoas insensíveis, que nunca conseguiram sentir nada pelos outros. Seu único sentimento é o da ganância, não importando os meios.
Caro leitor, não é assim que você está se sentindo? Estamos sendo atacados por criminosos-padrão e por criminosos que não eram padrão, pelo menos há algum tempo. E esses criminosos que não são padrão matam todo o esforço de construirmos um país melhor e uma sociedade mais feliz. Destroem nossos sonhos e sequer consideram as nossas dificuldades. Apareceram, um dia, risonhos, pedindo o nosso voto e, agora, eleitos, não nos pedem mais nada, mas nos tiram o que temos, o que conseguimos com nosso trabalho.
Muitos desses criminosos vestirão sua pele de cordeiro, decorarão passagens bíblicas, treinarão seu melhor sorriso e voltarão. Temos que reconhecê-los, para não cairmos na mesma arapuca. Eles tentarão. Eles são persistentes e confiam em nosso esquecimento.
BAHIGE FADEL