Ó MÁQUINA!
No século passado, quando a tecnologia começou a ficar muito importante para o desenvolvimento das atividades humanas, o poeta Cassiano Ricardo escreveu a poesia Ladainha, em que faz uma amarga reflexão. Ladainha, como se sabe, é um tipo de oração, em que há enumerações e repetições. É, na realidade, uma súplica, mas na linguagem popular, é algo enfadonho, repetitivo, monótono. Desconsolado com a importância que se dava à máquina, o poeta terminou a poesia da seguinte maneira:
(…)
Por que levantar o braço
para colher o fruto?
A máquina o fará por nós.
Por que labutar no campo, na cidade?
A máquina o fará por nós.
Por que pensar, imaginar?
A máquina o fará por nós.
Por que fazer um poema?
A máquina o fará por nós.
Por que subir a escada de Jacó?
A máquina o fará por nós.
Ó máquina, orai por nós.
Não, caro leitor, não sou contra a máquina. De jeito nenhum. Ser contra a máquina é negar o desenvolvimento da sociedade, é desconhecer os muitos benefícios que ela é capaz de proporcionar nas atividades das pessoas, na cura das doenças, por exemplo, na aceleração e aperfeiçoamento dos resultados. Ninguém quer matar a tecnologia ou condená-la à prisão perpétua por algum crime cometido.
Referi-me à poesia de Cassiano Ricardo, porque, muitas vezes, me sinto substituído pela máquina. Muitas vezes, percebo que, porque não uso a máquina em meu trabalho ou no meu dia a dia, sou colocado de lado, sou discriminado. É que acho que devo usar a máquina, não para ser mais moderno, mas para me tornar uma pessoa melhor, um profissional melhor e mais eficiente. Usar a máquina apenas para ser mais moderno, para estar ‘mais antenado’ não me diz coisa alguma e, por isso, reajo com angústia.
Um dia, um diretor de escola me mostrou um programa da internet em que havia uma pessoa declamando poesias e me disse: Por que você não usa esse programa na sala de aula? Esse programa é atual e está sendo utilizado em grandes escolas. Depois de ouvir por alguns instantes o tal programa, disse ao diretor que não precisava dele. O diretor ficou surpreso. Por quê? Porque sou capaz de declamar essas poesias muito melhor do que o profissional do programa. – respondi a ele.
A máquina deve ser utilizada para melhorar e aperfeiçoar as atividades humanas. Essa é sua principal função. Se não for para isso, não haverá sentido algum.
Como professor, preciso ser eficiente e eficaz, isto é, preciso fazer bem feito aquilo a que me proponho e, ao mesmo tempo, o que faço deve ter utilidade para os meus alunos. Usarei a máquina nessa atividade, se ela me ajudar a ser mais eficiente e mais eficaz, não porque, com isso, parecerei mais moderno aos olhos da sociedade. Nem quando jovem pretendi ser moderno. Sempre quis ser uma pessoa melhor. Hoje melhor do que ontem, amanhã melhor do que hoje.
Não quero ser escravo da máquina.
BAHIGE FADEL