Bahige Fadel

A PALAVRA, artigo de Bahige Fadel

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A PALAVRA

Desde criança, tive uma relação muito especial com as palavras, Os motivos nem sempre foram os mesmos, mas a relação nunca deixou de ser especial. Já aos cinco anos de idade, ao chegar ao Brasil, comecei o trabalho de conquista da palavra em língua portuguesa. Era importante conquistá-la o mais rápido possível, para poder comunicar-me com o novo mundo em que vivia. Conquista prazerosa. A cada palavra nova, mais uma possibilidade de compreender e ser compreendido. E depois, transmitir a conquista para os pais, que tinham a mesma necessidade.

Já na adolescência, a palavra continuou a ser importante em minha vida. Agora radialista, era preciso usar bem as palavras. Pronunciá-las com correção, para serem bem entendidas. Isso representava a conquista de audiência e prestígio. As palavras deveriam chegar perfeitas aos ouvintes. Daí, a preocupação com a escolha da palavra propriamente dita e do tom em que deveria ser transmitida. E haja treinamentos. Falar sozinho no banheiro. Ouvir a própria voz. Receber o retorno através da satisfação do ouvinte.

E essa relação com as palavras continuou. Virei professor. A responsabilidade aumentou ainda mais. Era preciso usar a palavra para informar e formar. Usar a palavra para auxiliar crianças e jovens a serem pessoas melhores. Trabalho árduo. Cada palavra errada poderia causar tragédias emocionais. Poderia causar raiva ou tristeza. As palavras transmitidas deveriam representar conhecimento e esperança. O conhecimento que deveria chegar ao educando como informação, para que ele pudesse transformá-la em sabedoria. E também como esperança. Sim, a palavra transmitindo esperança. Afinal, o que seria o processo educacional, se nem ao menos pudesse transmitir esperança de uma vida melhor?

Essa relação durou muito tempo. Aliás, paras ser mais preciso, durou cinquenta e quatro anos. Mas não parou aí. Houve um tempo em que decidi embrenhar-me na política. Nova relação especial com a palavra. Usar a palavra para convencer, para debater, para esclarecer, para provar que a sua verdade é melhor que a do outro. Tive sucesso às vezes. Mas não foi sempre. Descobri, na época, que nem sempre se busca a verdade. Descobri que muitas pessoas preferem a palavra fácil, que convém para o seu ego e seus mais torpes anseios. Na política, muitas vezes, a palavra se envergonha de sair de determinadas bocas e de estar em determinadas cabeças. Palavras que são pronunciadas para ocultar a verdade, para espalhar o ódio, para o disfarce, para a soberba, para o engodo, para demonstrar poder. Palavras manchadas, palavras que se envergonham de quem as tem e de quem, por interesse, acredita nelas e as adota como verdades.

BAHIGE FADEL

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