Sabe? Já acreditei em Papai Noel, sim. E como esperava por ele! Que emoção ao acordar e encontrar o presente pedido. É bem verdade que o meu pai de verdade me dava as dicas antes do Natal. Não peça um brinquedo muito grande, que o Papai Noel tem muita coisa para carregar e – coitado! – ele está velhinho para tanto peso. Ou: Não peça um brinquedo muito caro, pois pode faltar dinheiro para ele comprar. Não se esqueça de que o Papai Noel tem que entregar brinquedos para todas as crianças. Bem, para todas as crianças que foram boas, obedientes, estudiosas. Você foi tudo isso, não é? E eu dizia que sim, com toda força, que era para que o Papai Noel ouvisse minhas palavras e não se esquecesse de colocar em meu sapato um carrinho de pressão ou um revólver de espoleta. Naquele tempo, não existia esse negócio de que presentear com um inocente revólver de espoleta estimulava a violência. A gente brincava com o revólver e não ficou violento.
O mundo ficou violento, sim. Muito violento! Mas não foi por culpa do revólver de espoleta que eu ganhei de Papai Noel. Foi por outros motivos. E esses motivos nada tiveram a ver com o Natal. A gente ‘matava’ o amigo e, depois, ia ao campinho jogar futebol com a bola novinha que ele pediu para o Papai Noel. Bola de capotão, que nem as bolas dos jogos oficiais e a gente acompanhava pela rádio Tupi. Era uma festa! E lá no campinho, os outros amigos, mesmo ‘mortos’ pelo meu revólver de espoleta, me matavam, e aos outros, com uma espada linda, que nem as espadas dos heróis dos gibis que a gente lia na infância.
Depois, no entanto, veio a professora, que, por algum motivo, nos contou a grande novidade: Papai Noel não existe. Papai Noel é o pai de cada um, que espera a gente dormir e, à noite, coloca o presente no lugar combinado. Com isso, o Natal perdeu um pouco a sua graça. Algum tempo depois, perdido o mistério do presente de Papai Noel, o pai da gente passou a presentear, no Natal, com tênis novos ou com uma calça comprida, que a gente estava ficando homem, com uma camisa novinha, que era para a gente usar apenas quando fosse à missa ou quando houvesse uma festa de aniversário em casa chique.
Hoje, passados tantos anos, tenho vontade de voltar a acreditar em Papai Noel. Tenho vontade de que as crianças acreditem no bom velhinho, que, em seu trenó, vinha lá do polo norte para presentear as crianças que tinham ido bem nos estudos, que não tinham judiado da irmãzinha, que tinham praticado apenas as boas ações durante o ano. E quando a gente contava, sem querer, uma mentira para o papai, para não perder o presente de Papai Noel, ia correndo para a igreja, para confessar o enorme pecado e ser perdoado pelo padre, depois de levar uns pitos dele. Não faça mais isso. Isso é muito feio. Papai do céu ficou muito magoado com você. Além disso, havia a penitência. E a gente ficava torcendo para que ela não fosse muito pesada. Para ser perdoado – dizia o padre – você tem que rezar dez ave-marias e cinco pais-nossos. Ufa! Não foi tão difícil assim. E a gente rezava rápido, para ir brincar na rua, jogando bola de gude.
É, os tempos mudaram. Nem sei se as crianças acreditam em Papai Noel. Nem sei se elas acreditam que o Papai Noel virou tecnológico e agora consegue fabricar celulares de última geração, iPad, iPhone, iMac. I um monte de coisas sofisticadas, com as quais elas – as crianças modernas – brincam ou pensam que brincam, conversando com máquinas, não com pessoas. Não sabem mais o que é campinho de futebol. Revólver de espoleta, nem pensar! Estimula a violência. Mas os jogos de guerra, combate e luta do PlayStation não têm problema algum. É coisa moderna. Devem achar que é muita bobeira acreditar em Papai Noel. Ser esperto é não acreditar nessas coisas e exigir, sim, o verbo é exigir, que o pai de verdade, que não tem tempo de brincar com ele, lhe dê a máquina sofisticada e moderna que viu na internet e que o Luciano, seu colega de classe, já tem e a leva à escola não para brincar, mas para fazer inveja aos outros.
Assim mesmo eu quero acreditar em coisas simples e puras. Quero acreditar que ainda existem pais que preferem brincar com os filhos a serem substituídos pelas máquinas sofisticadas e modernas.Deve ser ingenuidade minha. Fazer o quê? Pelos menos, isso ainda não mudou em mim. Tomara que não mude nunca. Assim, pode ser que o Papai Noel, numa noite que não precisa ser de Natal, venha até minha casa e me dê um lindo presente, que pode ser mais paz no mundo, mais compreensão entre as pessoas e mais vontade de o ser humano conviver com o ser humano, e não apenas com as máquinas sofisticadas.